terça-feira, 12 de julho de 2016

Mitologia Grega

   Quando o assunto é mitologia grega, nós podemos sentar e falar do assunto por infindáveis horas. Essa rica cultura engloba histórias sobre a criação do mundo, guerras entre deuses e titãs, bestas mitológicas, aventuras de heróis, guerreiros, deuses e etc. À ela é atribuída grande influência cultural.
Alguns dos principais deuses da mitologia grega, expostos na fachada de um prédio da Universidade de Atenas.

   A mitologia grega, apesar do nome, não possui uma origem puramente grega. Ela é uma das culturas dos povos indo-europeus, pré-gregos, asiáticos, egípcios e outros povos com os quais o gregos tiveram contato. O tempo foi o fator que mais enriqueceu a cultura local, pois com o tempo e a miscigenação cultural, a mitologia grega evoluiu até o ponto fantástico que conhecemos hoje.
   Para entendermos as origens da mitologia, precisamos entender as origens do povo grego, o berço da sua civilização e outras dezenas de detalhes. Para isso, vamos começar conhecendo a Península Balcânica (sua terra natal) e a linha do tempo que levou às evoluções culturais:

Bálcãs

   Península Balcânica (Bálcãs) é o nome histórico e geográfico que designa a região sudeste da Europa, que hoje cobre a área de países como Albânia, Bósnia e Herzegovina, Bulgária, Grécia, República da Macedônia, Sérvia, Montenegro, porção européia da Turquia (Trácia) e, em algumas descrições, Croácia, Romênia, Eslovênia e Áustria. O nome da península faz menção a Cordilheira dos Bálcãs, que se estende do leste da Sérvia até o Mar Negro.
Região clara marca a área de Bálcãs
   Arqueólogos datam que a região é habitada desde 200.000 A.C. A cultura neolítica (Era da pedra polida) foi desenvolvida na região por volta do ano 7000 A.C. Com ela vieram as primeiras demonstrações artísticas, através da cerâmica decorada. A região foi colonizada pela primeira vez por povos semi-nômades da Russia, no ano 3500 A.C, e posteriormente por povos da Europa Central. Partindo deste ponto, a região se tornou alvo de disputas e pertenceu a vários povos, tais como os persas, gregos, bizantinos e otomanos. Todo esse fluxo de povos foi uma das mais fortes influências para o enriquecimento cultural da civilização que viria a nascer ali, herdando influências culturais de quase todos os povos que um dia pisaram naquelas terras.

   Os primeiros habitantes da região, em sua maioria agricultores, atribuíam um espírito a cada aspecto da natureza. Mais tarde, com a evolução cultural, esses espíritos passaram a tomar forma humana e entrar na mitologia local como deuses e deusas, como cita Carlos Ceia ( Professor e escritor português) :

 "Os complexos fenômenos da natureza foram certamente os primeiros a serem explicados de forma fantástica, sendo aí que nasce verdadeiramente o primeiro conjunto de narrativas míticas organizadas em texto escrito. Muito antes de terem circulado de geração em geração até o tempo de Homero e de Hesíodo."

   A corporificação dessas energias em formas humanas foi a primeira etapa de um longo processo de enriquecimento cultural, como quando as tribos do norte invadiram a Península Balcânica e trouxeram consigo um panteão de deuses e crenças voltadas à guerra, conquista, força, valentia e ao heroísmo firmado em sangue. Isso fez com que as divindades antigas que povoavam as mentes dos povos locais se fundissem ou até mesmo perdessem espaço para as novas divindades trazidas com os invasores poderosos.
   Em um processo milenar, a cultura local evoluiu e perdurou até alcançar o cume durante o período mais poderoso da Grécia antiga (1100 A.C à 146 A.C). Durante esse processo a literatura grega e as poesias épicas dividiram a cronologia mitológica em três grandes períodos : Mito da Origem, Era em que Homens e Deuses Mesclavam Livremente e Era Heroica.

Mito da Origem

Gaia, por Anselm Feuerbach, 1875.
   O primeiro grande período da mitologia grega é focado nas origens de tudo, desde os próprios deuses até o universo e tudo que o habita. A narrativa completa sobre os três períodos da mitologia pode ser lida no poema épico Teogonia, de Hesídio, com alguns trechos disponíveis a partir da página 87 deste PDF.

   De acordo com a mitologia grega, no princípio só existia o Caos (entidade que representa o vazio). Em um dado momento, de maneira totalmente espontânea, gerou-se Gaia, a primeira de todos os titãs, a Mãe-Terra (Gaia seria toda a extensão de terra do nosso planeta). Posteriormente, o Caos gerou quatro novos filhos, primeiro veio o Tártaro, a escuridão primeva (entidade considerada como o próprio submundo), e então veio Eros (entidade que representa a atração amorosa), sendo o mais jovem filho do Caos, Érebo (entidade que personifica as trevas absolutas) e Nix (entidade que representa a noite). Os três irmãos vieram a criar, de maneira assexuada, quatro filhos: Hemera (entidade que representa o dia), Ponto (entidade que representa a água primordial), Óreas (personificação das montanhas) e Urano (entidade que representa toda a extensão do céu).

Titãs

   Neste ponto o mundo já havia sido criado e tudo que havia nele vivia em harmonia. Gaia, por ter sido o elemento primordial, era por si a maior concentração de energias reprodutoras, e por esse motivo ela criou Urano como seu igual, desejando ter alguém que a cobrisse todas as noites e fornecendo um lar eterno para os deuses. E assim aconteceu, todas as noites Urano cobria Gaia totalmente, e de sua união nasceram os doze titãs: 
  • Oceano: Titã que personifica toda a extensão de água salgada ou "o grande rio que circula gaia". Possuía a aparência de um homem, mas em sua cabeça haviam garras de caranguejo como chifres e ele possuía uma grande barba. Casou-se com sua irmã, a titânide Tétis, e dessa união nasceram as ninfas do mar, as nereides e todas as criaturas marinhas presentes na mitologia.
  • Céos: Titã que governa o norte, e personifica a inteligência. Céos casou-se com a titânide Febe, com quem teve duas filhas: Leto, a deusa da anoitecer, e Astéria, a deusa estelar. Não existem muitas informações sobre este titã que tenham sobrevivido até os dias atuais, porém, sua participação na mitologia grega continua sendo de grande importância.
  • Crio: Titã que governa o sul e personifica o inverno, o frio, as criaturas marítimas e os rebanhos. Seu poder possui ligação com as criaturas do mar abissal. Casou-se com sua irmã, a titânide Euríbia, com quem gerou seus três filhos: Palas, Astreu e Perses. Crio foi aprisionado no Tártaro, assim como os demais titãs que se aliaram a Cronos na Titanomaquia (guerra centenária que aconteceu entre os deuses e titãs). Assim como Céos, os detalhes sobre sua aparência e história não sobreviveram até os dias atuais.
  • Hiperião: Titã que governa o leste e personifica o sol. Sua aparência é a de um guerreiro em uma armadura dourada e seus olhos brilham como o próprio sol. Casou-se com sua irmã, a titânide Teia, juntos deram a luz a três filhos: Eos (deusa do amanhecer), Selene (deusa da lua) e Hélio, que como seu pai, também personifica o sol.
  • Jápeto: Titã que governa o oeste. Personifica o tempo de vida e o tempo de morte, possuindo certa afinidade pela morte violenta. Casou-se com Clímene, ninfa filha dos Titãs: Oceano e Tétis. De sua união com Clímene, foram gerados os filhos: Atlas "o que suporta", Prometeu "o que pensa antes" (titã conhecido por ter criado a humanidade e posteriormente ter doado o fogo aos mesmos), Epimeteu "o que pensa depois" e Menoécio "poder da dor" ."O Perfurador", como é conhecido, fez parte do motim contra Urano, junto a seus irmãos, Hiperião, Crio, Céos e Cronos.
  • Teia: Titânide regente do céu claro, do brilho dos olhos, da prata e do ouro. Esposa de Hiperião.
  • Reia: Titânide que personifica a fertilidade, mãe de todos os deuses do Olimpo. Reia fora a maior responsável pelo que iniciaria a titanomaquia. Casada com o seu irmão, o titã Cronos, Reia gerou seus filhos, em ordem cronológica: Hera (deusa das esposas, das bodas, da maternidade e do céu), Deméter (deusa da agricultura), Héstia (deusa virgem, do lar, lareira, arquitetura, vida doméstica, família e estado), Hades (deus dos mortos e do mundo inferior), Poseidon (deus dos mares e terremotos), e por fim Zeus (deus dos céus, raios, relâmpagos, ordem e justiça), que fora escondido por Reia e criado secretamente em Creta (atualmente a maior e mais populosa ilha da Grécia, situada a sul do mar Egeu)
  • Têmis: Titânide guardiã dos juramentos e da justiça. Fora a segunda esposa de Zeus (depois de Métis e antes de Hera).
  • Mnemosine: Titânide que personifica a memória. Fora também esposa de Zeus, com ele gerara as nove musas.
  • Febe: A mais bela entre as titânides. Provavelmente a primeira divindade a personificar a lua na mitologia grega. Casada com Céos.
  • Tétis: Titânide que personifica a fecundidade da água, que alimenta e forma a seiva da vegetação. Casada com Oceano.
  • Cronos: O mais jovem e mais terrível de todos os titãs. Cronos era o deus to tempo em sua forma mais destrutiva. Percursor da separação entre o céu e a terra (Urano e Gaia). Fora casado com sua irmã Reia.
   
   Pouco tempo depois de terem gerado os titãs, Gaia e Urano geraram mais seis filhos, três ciclopes e três hecatônquiros (criaturas que possuíam cem braços e cinquenta cabeças), que foram banidos para o Tártaro, pois Urano sentiu repulsa das aberrações que haviam criado.
   Urano via o grande poder de seus filhos e os temia. Alegando odiar os filhos, Urano os aprisionou novamente no útero de sua mãe. Gaia sofria e urrava de dor por ter seus doze filhos, já criados, presos em seu útero. Gaia queria por os filhos em liberdade e por isso passou a odiar Urano. Gaia clamou pela ajuda de seus filhos, mas de todos, apenas um mostrou coragem suficiente para enfrentar o pai, este era o filho mais novo, Cronos, que já odiava assistir a luxúria do pai.
   Gaia retirou de teu seio o aço, e com o auxílio de Nix confeccionou uma foice feita de um metal inflexível e a concedeu a Cronos, para que o mesmo castrasse Urano. Então, quando a noite chegou e Urano veio cobrir Gaia, os titãs Céos, Crio, Hiperião e Jápeto, que estavam escondidos nos quatro cantos do mundo, o emboscaram segurando-o, enquanto Cronos, que estava escondido em baixo de Gaia, saiu com a foice e o castrou, separando para sempre o céu e a terra.
   Após castra-lo, Cronos lançou seus testículos ao mar, porém, algumas gotas caíram sobre a terra e a fecundaram, e desta ultima união entre céu e terra nasceram os gigantes, as eríneas e as melíades.
A Castração de Urano Afresco, por Giorgio Vasari e Cristofano Gherardi, 1560

Titanomaquia - A Guerra entre Deuses e Titãs

   Com a queda de Urano, Cronos subiu ao poder junto a seus irmãos. A partir daí cada titã assumiu seu aspecto na natureza e viveram suas vidas, construíram seus laços (como dito nas descrições feitas acima sobre cada um). Neste mesmo período a humanidade começava a dar seus primeiros paços e os titãs chamaram está era de "Era de Ouro".
   Cronos, que a essa altura já havia se tornado o senhor do céu e rei entre os titãs, casou-se com Reia. Enquanto Reia ainda esperava seu primeiro filho, Cronos fora alertado pelo próprio Urano, que um de seus filhos o destronaria. Com medo de perder seu trono, Cronos passou a engolir seus filhos ainda recém nascidos.
Reia e Cronos em uma reprodução romana em baixo relevo
   Embriagado com o poder e paranoico com a ideia de perder seu trono, Cronos começou a perceber o imenso poder de cada um de seus irmãos, e para impedir que eles pudessem se unir contra ele, Cronos os aprisionou no Tártaro.
   Gaia se enfureceu ao ver que Cronos havia se tornado tão tirano e perverso quanto Urano. E por conta desse ato, Gaia iniciou a trama de uma nova vingança, dessa vez contra Cronos. Aproveitando-se de que Reia odiava ter seus filhos aprisionados no estômago de Cronos, Gaia a persuadiu a enganar Cronos. Então, quando seu ultimo filho, Zeus, veio ao mundo, Reia o substituiu por pedras enroladas em panos, Cronos não percebeu o falsário e engoliu as rochas. Zeus foi criado secretamente na ilha de Creta.
   Mais tarde, já na fase adulta, Zeus decidiu por um fim na tirania do pai. Métis, primeira esposa de Zeus e filha do titã Oceano, conhecedora de todas as ervas, confeccionou uma poção poderosa que fez com que Cronos regurgitasse todos os filhos. A guerra começou e durou por 100 anos.
   Gaia alertou Zeus, dizendo que mesmo com a ajuda de seus cinco irmãos, ele jamais derrotaria os titãs, pois o único meio de o fazer seria descendo ao Tártaro e resgatando "seus tios", os ciclopes e os hecatônquiros. Zeus o fez sem pensar duas vezes. Quando retornou do Tártaro, logo pode perceber os ares da vitória, os ciclopes trabalharam duro e forjaram para Zeus os raios, itens decisivos em sua vitória, enquanto os hecatônquiros, utilizando seus cem braços, ficaram a distância e arremessaram centenas de pedras contra os titãs.
   Zeus triunfou, e se tornou o rei do universo, atribuindo a cada um de seus irmãos uma responsabilidade divina. Os titãs foram banidos para o Tartáro, cada um pagando eternamente uma penitência (como a famosa penitência atribuída a Atlas, que fora condenado a passar a eternidade sustentando o planeta em suas costas). Para vigiar e garantir que os titãs cumpririam seus deveres, Zeus enviou os hecatônquiros, como guardas de sua confiança. Mais uma vez gaia se enfureceu, ela nunca aprovou que os hecatôquiros vivessem no Tártaro.
Ilustração de Atlas, cumprindo sua penitência.

   A partir daí Gaia tentou incontáveis vezes derrubar os deuses olimpianos, porém, jamais obteve sucesso. Os deuses permaneceram invictos, e após ver que não derrotaria os deuses, Gaia finalmente cedeu, fazendo um acordo com Zeus, no qual se comprometia a jamais voltar a tentar contra seu governo. Assim Gaia se tornou a primeira titã a viver no Olimpo.


Conclusão

   Ufa! Uma corrida olímpica até aqui, não acham? kkkk
   Bem, esta é, de maneira extremamente resumida, a visão dos primórdios da mitologia grega, digamos que este seja o primeiro ato em um dos maiores e mais fantásticos enredos já escritos pelo homem. (gostaria de esclarecer novamente que não estamos falando aqui de nenhuma religião, apenas do estudo dos mitos, uma vez que "mito" é toda e e qualquer narrativa sacra)
Ha muito mais para ser explorado na mitologia grega, bestas, heróis, deuses e suas aventuras. E em breve farei novos posts contando mais sobre essa épica narrativa!

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